domingo, 29 de janeiro de 2017

A MARCA DA MALDADE (Touch of Evil), 1958


Orson Welles estava há 10 anos sem filmar nos Estados Unidos quando Charlton Heston conseguiu que fosse ele o diretor de “A Marca da Maldade”. O próprio Welles reescreveu o roteiro, além de também atuar e realizar aquele que seria seu último filme em Hollywood. E que filme! Um marco do gênero policial noir num thriller que subverte a ordem ao mostrar um investigador mexicano como herói e o vilão sendo o norte-americano capitão de polícia Hank Quinlan. Interpretado por Orson Welles, Quinlan é uma figura monstruosa em seu aspecto repugnante e na maldade com que pautou sua vida como homem da lei corrupto que age numa cidade de fronteira com o México. A famosa sequência de abertura é apenas um dos grandes momentos desta verdadeira aula de cinema que é “A Marca da Maldade”, filme que como “Cidadão Kane” deve ser visto muitas vezes para se descobrir plenamente sua criatividade. Welles com nariz postiço e mais rotundo que nunca não é o destaque maior do excelente elenco que tem Heston muito bem e Janet Leigh provocante num tipo que repetiria em “Psicose”. Ficam para Akim Tamiroff e Joseph Calleia as atuações mais relevantes desta obra-prima do talentoso Welles. 10/10






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quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

A UM PASSO DA ETERNIDADE (From Here to Eternity), 1953


Fred Zinnemann tinha predileção por personagens fortemente determinados que não abriam mão de seus princípios mesmo quando submetidos aos desígnios de poderosos sem escrúpulos. Assim foram Will Kane, Sir Thomas Moore e o soldado Robert E. Lee Prewitt, este de “A Um Passo da Eternidade”. As mais de 800 páginas do best-seller de James Jones que escancarou as mazelas do militarismo foram transformadas num filme de 118 minutos que igualmente denunciou que ser soldado não significava apenas a possibilidade de voltar da guerra com o peito coberto de medalhas. Para poder filmar o livro a Columbia teve que atenuar ou omitir passagens, mas estão neste corajoso filme, tão forte quanto amargo, a crueldade cercada pelos muros do quartel de uma base aérea no Havaí em 1941, às vésperas do ataque a Pearl Harbor. “A Um Passo da Eternidade” arrebatou cinco prêmios Oscar, ignorando a extraordinária interpretação de Montgomery Clift que humilhou Burt Lancaster e Frank Sinatra (boa atuação, mas não para o prêmio que recebeu). Deborah Kerr inteiramente fora da personagem da esposa adúltera (por onde andava Lana Turner?) e Donna Reed (outra premiação equivocada). O tempo não fez muito bem a “A Um Passo da Eternidade” que hoje impressiona muito menos que décadas atrás, sem deixar de ser um grande filme. 8/10






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domingo, 22 de janeiro de 2017

LEVADA DA BRECA (Bringing Up Baby), 1938


Insatisfeito com a interpretação de Katharine Hepburn em “Levada da Breca”, Howard Hawks a chamou num canto e disse: ‘Kate, nem Buster Keaton, Chaplin ou Harold Lloyd sorriem quando atuam; a graça deles vem das situações nas quais se envolvem’. A atriz, em sua primeira comédia, mudou o estilo de atuar e o resultado foi uma de suas mais memoráveis performances como a rica herdeira que se apaixona pelo jovem e tímido paleontólogo interpretado por Cary Grant. Do início ao fim o casal se envolve em confusões com ‘Baby’, um leopardo e ‘George’, um cão, além de muitos outros tipos atrapalhados. Grant faz uso pela primeira vez no cinema da expressão ‘gay’ com o sentido que ela possui atualmente e a sequência em que ele tenta esconder o vestido rasgado de Kate é antológica. E é a deliciosa, anárquica e esfuziante Kate quem conquista Grant, Baby, George e o público. Considerada uma exemplar ‘screwball comedy’ esta comédia nem sempre teve status de clássica, mesmo porque foi um fracasso de bilheteria e deu grande prejuízo à RKO. Peter Bogdanovich foi quem primeiro afirmou que o alucinado filme de Hawks era uma obra-prima e inspiração para seu “Esta Pequena é uma Parada” em 1972. 8/10





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quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

CARMEN JONES (1954)


Filmes com elencos compostos exclusivamente por negros sempre fracassaram nas bilheterias e nada indicava que Hollywood voltasse a produções desse tipo. Mas eis que o austro-húngaro Otto Preminger convenceu a 20th Century-Fox a produzir um musical só com negros no elenco. Mais surpreendente ainda é que o filme seria uma versão da ópera “Carmen”, de Georges Bizet, aproveitando a adaptação feita para a Broadway em 1943 com letras de Oscar Hammerstein II. A cigana Carmen passa a ser uma mulata irrequieta e atrevida que conquista o cabo da Força Aérea Joe e o trai com o campeão de boxe Husky Miller, com a história transferida para os tempos da II Grande Guerra. Como não poderia deixar de ser essa ‘subversão’ foi boicotada nos Estados Unidos, fazendo no entanto sucesso e sendo bastante premiada na Europa, menos na França, onde foi proibida. “Carmen Jones” teve brilhante direção e foi admiravelmente interpretado por Dorothy Dandridge e Harry Belafonte, ambos dublados nas sensacionais canções. “La Habanera” virou “Dat’s Love” e “Toreador” ficou sendo “Stan’ up an’ Fight”, alguns dos destaques da esplêndida trilha musical. O trágico desfecho é pura emoção e Dorothy só não se tornou uma das maiores estrelas de seu tempo porque era negra. Por sua deslumbrante atuação foi indicada ao Oscar, mas a Academia preferiu a loura Grace Kelly. 9/10





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segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

FLECHAS DE FOGO (Broken Arrow), 1950


Tido e havido como o primeiro western do cinema norte-americano simpático aos índios, adveio desse fato a fama maior de “Flechas de Fogo”. Fama por sinal discutível já que “A Passagem do Diabo” (Devil’s Doorway), de Anthony Mann e também favorável aos nativos, foi rodado em 1949. E antes disso Mestre John Ford já havia, em “Sangue de Heróis” (Fort Apache), mostrado que os índios mereciam respeito e não só serem dizimados pela Cavalaria. Neste seu primeiro western Delmer Daves privilegiou o tema principal realizando um filme sem muita ação mas que ousadamente discute até a aceitação de casamento entre brancos e índios, se bem que James Stewart aos 42 anos está longe do par ideal para a adolescente Debra Paget então com 16 aninhos. Jeff Chandler com seu estilo característico de interpretação impassível foi inacreditavelmente indicado ao Oscar de Ator Coadjuvante ao viver Cochise pela primeira vez. Jay Silverheels como ‘Jerônimo’ mostra que tinha mais talento interpretativo que Chandler. Albert Maltz, um dos dez da Lista Negra do Macarthismo foi um dos roteiristas de “Flechas de Fogo”, western que após a onda revisionista parece até ingênuo, mas que em 1950 chocou os espectadores que acreditavam que ‘índio bom é índio morto’. 7/10





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sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

GILDA (Gilda), 1946


Longe de ser uma obra-prima, “Gilda” é uma das melhores definições do tão discutido termo ‘filme clássico’. Fez de Rita Hayworth a mulher mais desejada do mundo naqueles tempos e centenas e centenas de bebês, inclusive no Brasil receberam o nome ‘Gilda’ ao nascer. Até uma bomba foi assim chamada. Por aqui Gilda virou marchinha de Carnaval e o filme dirigido por Charles Vidor reunindo Rita e Glenn Ford foi um enorme sucesso de bilheteria. Pela primeira vez no cinema vimos uma câmara perdidamente apaixonada por uma atriz, seduzida por seus olhares, trejeitos e arrebatadora beleza. Rita dançando e cantando (foi dublada, todos sabemos) “Put the Blame on Mame” e “Amore Mio” são desses momentos eternos do cinema. Ah sim, o filme é um arremedo de “Casablanca” sem o charme, trama e diálogos inteligentes deste e também porque Glenn Ford não é Humphrey Bogart e Charles Vidor não é Michael Curtiz. Frases bizarras ditas pelos personagens chegam a fazer rir num filme misógino com dois homens enamorados um pelo outro desprezando o monumento que é Gilda. O grotesco final de tão inadequado parece ter sido escrito pelo censor do Código Hays. Mas se em “Casablanca” Ilse e Rick tiveram Paris, em “Gilda” o cinema teve Rita Hayworth deslumbrantemente esplendorosa e por isso “Gilda” é sim, um clássico. 7/10






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terça-feira, 10 de janeiro de 2017

ESCRAVAS DO MEDO (Experiment in terror), 1962


Um dos mais bem sucedidos diretores norte-americanos, Blake Edwards é sempre lembrado pela querida série ‘Pantera Cor-de-Rosa’ com o impagável Inspetor Closeau. Mas são de Edwards também as comédias “Victor ou Victoria”, “Um Convidado Bem Trapalhão”, “A Corrida do Século” e “Anáguas a Bordo”, bem como a comédia romântica “Bonequinha de Luxo” e o drama “Vício Maldito”. Menos conhecido é o suspense “Escravas do Medo”, feito num tempo em que as séries policiais rivalizavam com os faroestes na TV norte-americana. Assistido hoje este filme de Edwards perdeu um pouco do impacto, ainda que seja um absorvente thriller no qual Glenn Ford quase nada faz deixando espaço para Ross Martin brilhar como o assassino asmático que aterroriza as belas Lee Remick e Stephanie Powers. Afinal, o que torna então “Escravas do Medo” imperdível? Uma das mais profícuas parcerias do cinema foi formada por Blake Edwards com Henry Mancini e para este filme Mancini compôs uma trilha nada menos que extraordinária, uma das melhores de sua admirável carreira como compositor. A trilha vale o thriller e melhor que isso só ouvir o álbum inteiro, não é mesmo, José Flávio Mantoani? 7/10






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sábado, 7 de janeiro de 2017

AS TRÊS NOITES DE EVA (The Lady Eve), 1941


Já houve quem, com certo exagero, dissesse que Preston Sturges foi mais importante para o cinema norte-americano que Orson Welles. E não é que então surge Peter Bogdanovich e afirma que os seus cinco filmes preferidos são “Suprema Conquista” (Howard Hawks), “Cupido é Moleque Teimoso” (Leo McCarey), “French Can Can” (Jean Renoir), “Papai por Acaso” e “As Três Noites de Eva”, estes dois últimos de quem mesmo? Acertou quem pensou em Preston Sturges! “As Três Noites de Eva” é uma comédia romântica e sofisticada do gênero muito em voga nos anos 30 e 40 chamado ‘Screwball Comedy’ ou comédia maluca para nós, invariavelmente com uma mulher agitada no centro de toda a trama. Barbara Stanwyck é a vigarista que pretende conquistar o rico herdeiro Henry Fonda, por quem acaba apaixonada num filme repleto de diálogos saborosíssimos (do também roteirista Preston Sturges) e com situações que se sucedem cada vez mais engraçadas até o desfecho feliz. Feliz mas que comprova que Eva com magnetismo, graça e beleza subjuga o homem. E essa Eva (Eve) é Barbara Stanwyck bonita, divertida e fascinante como o cinema nunca a havia mostrado. Fonda e um grupo seleto de coadjuvantes (Eugene Palette, Charles Coburn, William Demarest e outros) ajudam a dar mais classe ainda a esta joia de comédia. 8/10






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terça-feira, 3 de janeiro de 2017

PERFUME DE MULHER (Profumo di Donna), 1974


Quando foi lançada a versão norte-americana de “Perfume de Mulher”, com Al Pacino, praticamente todos os críticos compararam negativamente esse filme com o original italiano dirigido por Dino Risi. E lembraram que Vittorio Gassman como o aposentado capitão cego com o braço esquerdo mutilado teve uma daquelas atuações impossíveis de serem superadas. Mas como poderia Hollywood ao menos igualar este que é um dos melhores filmes de Dino Risi, menos engraçado que “Aquele que Sabe Viver” mas tão tragicômico como este? Ficou provado que certo tipo de cinema não se adequa ao comercialismo de Hollywood. Com “Perfume de Mulher” Risi se equilibra soberbamente entre o drama e a farsa criando um personagem que tenta esconder com seu sarcasmo e arrogância a amargura de sua vulnerabilidade que ele não aceita. A única saída é a morte mas diante dela Fausto se mostra não o leão que simulava ser, mas um homem fraco e titubeante. A primeira metade de “Perfume de Mulher” é primorosa, caindo no final especialmente pela presença da bela jovem apaixonada e rejeitada por Fausto quando o mais correto seria uma mulher mais madura para servir-lhe do amparo que ele nunca aceitou. Alessandro Momo, que interpreta o ajudante de Gassman, faleceu antes de completar 18 anos e antes do filme ser lançado em 1974. 8/10




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domingo, 1 de janeiro de 2017

QUELÉ DO PAJEÚ, 1969


Anselmo Duarte costumava afirmar que seu melhor filme era “Quelé do Pajeú” e poucos podiam contestar essa discutível opinião. Isso porque alguns anos após seu lançamento o filme simplesmente desapareceu, numa das mais lamentáveis incúrias do cinema brasileiro. “Quelé do Pajeú” passou para a categoria de lenda cinematográfica e somente os críticos e espectadores mais velhos, ao redor dos 70 anos de idade e que o viram nos cinemas, podiam falar do filme. Mais de 40 anos depois uma cópia legendada em Italiano foi descoberta na Europa, fato que pode ser considerado o mais importante do cinema brasileiro nos últimos tempos. Lima Barreto escreveu a história e roteiro que acabou sendo bastante alterado por Anselmo Duarte que a isso chamou de ‘roteiro adaptado’, filmando-o em Salto de Itú naquela que foi uma das mais caras produções do cinema brasileiro, com requintes de 70 mm e som estereofônico. O resultado foi um excelente ‘nordestern’, com muita ação, romance, sensualidade e algumas sequências verdadeiramente antológicas. Tarcísio Meira é o protagonista e Jece Valadão o vilão que Quelé persegue em busca de vingança em sua odisseia pelo sertão em luta constante entre as volantes e o bando de Lampião. Não só pelo fato da descoberta da cópia, mas e principalmente por ser outro grande filme de Anselmo Duarte “Quelé do Pajeú” é fundamental para quem ama o cinema. Resenha completa no blog Westerncinemania. 8/10





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