sábado, 30 de dezembro de 2017

VIVER A VIDA (Vivre Sa Vie), 1962


Saudado como renovador da linguagem cinematográfica em sua estreia como diretor com “Acossado”, o ex-crítico Jean-Luc Godard decidiu em seu terceiro longa metragem demonstrar que não havia limites para sua criatividade. “Viver a Vida”, drama sobre a jovem Nana (Anna Karina) que se torna prostituta em Paris, foi a história que Godard dividiu em doze quadros e a única explicação para essa ‘novidade’ talvez seja mostrar ao mundo que as narrativas convencionais não funcionavam. Sob uma falsa simplicidade o ego de Godard dá asas a sua arrogância e pretensa genialidade testando até onde é capaz de irritar o espectador. Um diálogo de quase cinco minutos em que se vê somente as nucas dos personagens, o monocórdico tema bruscamente truncado de Michel Legrand, os cortes que destróem o ritmo do filme, cansativas literatices e filosofices formam a nova estética ditada pelo inventivo francês. Entre as muitas citações há “Joana D’Arc” de Dreyer na tela em justaposição à mártir moderna que é Nana e, pasmem, um cartaz de “Spartacus” em meio ao trottoir de uma rua parisiense. Kubrick rebaixado pelo gênio Godard. Os belíssimos olhos de Anna Karina são motivo único de satisfação neste filme com que o autor quer homenagear os clássicos ‘B’ e cuja cena final, a morte de Nana, é de um amadorismo chocante. 3/10




sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

DANÇA COM LOBOS (Dances with Wolves), 1990


Realizar, em sua primeira experiência como diretor, um filme como “Dança com Lobos” foi um ato de inacreditável coragem e audácia de Kevin Costner. Durante os quatro meses de filmagem muitos ironicamente chamavam o filme de ‘Kevin’s Gate’ numa referência ao fracassado “Heaven’s Gate” de Michael Cimino. Isto porque tudo parecia indicar que um western contando a história de um oficial que passa a viver entre os índios ainda durante a Guerra de Secessão jamais atrairia o público. Porém nem a mais otimista das previsões poderia imaginar que “Dança com Lobos” receberia sete prêmios Oscar, inclusive os de Melhor Filme e Melhor Diretor e menos ainda que se tornasse enorme sucesso de bilheteria. Kostner é o tenente John Dunbar que se torna amigo de uma tribo Sioux e se casa com uma mulher branca que vive entre os índios desde pequena. Protetor dos Siouxes que se tornaram parte de sua vida, Dunbar é considerado traidor pelo Exército cujos soldados são mostrados como homens da pior espécie em contraste com os idealizados índios. Maravilhosas cinematografia e música (ambas premiadas com Oscars) ressaltam o encantamento que Kostner conseguiu num filme que, mesmo sem ser perfeito, envolve o espectador que não se dá conta das mais de três horas de duração. 9/10





sábado, 9 de dezembro de 2017

HOUVE UMA VEZ UM VERÃO (Summer of '42), 1971


Este filme de Robert Mulligan é um daqueles dramas nostálgicos que marcou muita gente que, ao assisti-lo, se lembrou de seus dias de adolescente. Especialmente os rapazes que recordaram da primeira vez, tão complicada quanto enfrentar o dono da farmácia para comprar o primeiro preservativo. A trilha sonora de Michel Legrand premiada com o Oscar embala a fantasia de Hermie (Gary Grimes), jovem de 15 anos que enlouquece ao conhecer Dorothy (Jennifer O’Neill). Esta bela mulher recebe a notícia que seu marido foi morto em combate na II Grande Guerra e surpreendentemente, nessa mesma noite, acaba levando o rapazola para a cama. Quando do lançamento do livro e do filme ainda não havia o surto do politicamente correto e a personagem da recém viúva não foi acusada de pedofilia, como seria hoje. E é justamente essa incoerente reação da mulher que compromete a história que descreve com certa delicadeza e alguma graça os devaneios dos adolescentes. O filme termina com o narrador (Robert Mulligan) dizendo que naquele verão Hermie tornou-se homem num final pretensamente ‘aberto’ e poético. Jerry Houser ótimo como o jovem mais decidido, enquanto Gary Grimes está bem como o aturdido rapazinho sortudo. Jennifer O’Neill é tão linda que seria exigir demais que fosse também boa atriz. Dois anos depois deste filme George Lucas realizaria o melhor dos filmes sobre adolescentes. 6/10




segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

AMEI UM BICHEIRO, 1953


A Atlântida reinava com as rentáveis chanchadas no início da década de 50 quando Jorge Ileli decidiu remar contra a correnteza e fazer cinema em outro gênero, o policial noir, então ainda em voga. Ileli roterizou a história de autoria de Jorge Dória e a dirigiu em parceria com Paulo Wanderley tendo como diretor assistente (José) Carlos Manga. O resultado da reunião desse grupo foi o muito bom “Amei um Bicheiro” que aborda o submundo do jogo do bicho, contravenção penal que mantinha a polícia ocupada num tempo em que não se falava em tráfico de drogas e armas. José Lewgoy é o banqueiro enganado por seu braço direito Cyl Farney que tem uma razão premente para trair o chefe: a necessidade de dinheiro para operar sua esposa Eliana. A queridinha da Atlântida não é a loura fatal da história, personagem que ficou para a francesa Josette Bertal. A dupla Ileli-Wanderley desenvolve a história magnificamente e a atmosfera noir criada pelo cinegrafista Amleto Daissé torna o Rio amedrontador com suas ruas mal iluminadas, cenário perfeito para este melodrama policial. Grande Otelo tem, segundo ele próprio considera, sua melhor atuação em um filme e a sequência de sua morte é marcante. Num ótimo elenco que conta ainda com Jece Valadão, Wilson Grey e Aurélio Teixeira em pequenos papeis até a dramaticamente limitada Eliana rende mais do que o esperado. 8/10