sexta-feira, 31 de março de 2017

UMA MULHER PARA DOIS (Jules et Jim), 1961


A Nouvelle Vague surpreendeu o mundo não só pelo estilo de filmar mas também pela abordagem de temas incomuns ao cinema. François Truffaut, um dos expoentes do movimento, levou às telas em seu terceiro filme um triângulo amoroso delicado, alegre, provocante e afinal doloroso. Jules e Jim são os amigos que se apaixonam pela radiante Catherine, mulher que os domina com sua irresistível personalidade fazendo com que os dois homens aceitem suas pequenas loucuras e previsíveis traições. Jeanne Moreau como a frívola Catherine é, tanto quanto o próprio Truffaut, responsável por tornar “Jules e Jim” uma história com inegável encanto. “Catherine não é uma mulher especialmente bonita” diz um dos personagens, e nem precisava ser linda pois com seu magnetismo e poder de sedução domina todo o filme. É Jeanne Moreau mais sedutora que nunca mesmo não sendo especialmente bonita. Exemplar na renovação da linguagem cinematográfica que mudaria a forma de se fazer filmes, “Jules e Jim” não chega a ser uma obra-prima justamente porque o ritmo apressado, cortes bruscos, pouca clareza de situações e um final tragicamente equivocado rouba parte do lirismo que Truffaut buscou atingir. 7/10






Direção: François Truffaut / Elenco: Jeanne Moreau - Oskar Werner - Henry Serre - Marie Dubois - Serge Rezvani - Vanna Urbino - Sabine Haudepin - Daniele Bassiak - Elen Bober - Michel Subor (narrador) - Jean-Louis Ruchard

quarta-feira, 29 de março de 2017

JOGOS E TRAPAÇAS / QUANDO OS HOMENS SÃO HOMENS (McCabe & Mrs. Miller), 1971


Este um insólito western do singular Robert Altman foge aos padrões convencionais do gênero com sua fotografia etérea (Vilmos Zsigmond) e trilha musical melancólica (Leonard Cohen) que criam uma atmosfera angustiante. A tristeza permeia toda a história de Jack McCabe (Warren Beatty), um empreendedor que chega a um remoto e frio povoado na fronteira com o Canadá e mesmo explorando o ramo da prostituição se defronta com a força do capitalismo e seus modos pouco leais. O vilão deste western é a grande empresa e o jogador fanfarrão e farsante McCabe está distante do modelo dos heróis comuns, ou não seria um personagem do iconoclasta diretor. Julie Christie é Mrs. Miller entre os lençóis do bordel que gerencia e o ópio que a domina. Lembrando “O Vingador Silencioso” de Sergio Corbucci, “McCabe & Mrs. Miller” teve inegável influência em “O Portal do Paraíso” e na série “Deadwood”. Recebido discretamente quando de seu lançamento, este essencial filme de Robert Altman ganhou nas últimas décadas o status de melhor obra do diretor e uma das grandes películas norte-americanas de todos os tempos. 7/10 - Resenha completa no blog http://westerncinemania.blogspot.com.br/





Direção: Robert Altman / Elenco: Warren Beatty - Julie Christie - Rene Auberjonois - Michael Murphy - Keith Carradine - Shelley Duvall - Hugh Millais - William Devane - Jace Van Der Veen- Manfred Schulz - John Schuck - Anthony Holland - Elisabeth Knight - Linda Sorensen - Carey Lee McKenzie - Jackie Crossland - Maisie Hoy - Elizabeth Murphy - Thomas Hill - Corey Fischer - Brantley Kearns - Bert Remsen

sexta-feira, 24 de março de 2017

ROCCO E SEUS IRMÃOS (Rocco e suoi Fratelli), 1960


Para o crítico Luís Carlos Merten este é “o melhor filme de todos os tempos e deve ser assistido de joelhos...” Exageros à parte, “Rocco e seus Irmãos” narra a desventura da família Parodi, mãe e cinco filhos, que deixa o Sul da Itália para tentar a sorte em Milão. Menos uma crônica sobre a desagregação familiar e mais a contenda entre o bem e mal representados pelo puro e generoso Rocco (Alain Delon) e seu malévolo irmão Simone (Renato Salvatori). A prostituta Nádia (Annie Girardot), tanto quanto o infeliz Simone é também vítima do contexto social em que vive neste drama intenso dividido desnecessariamente em cinco atos, um para cada filho. Os demais irmãos são figuras coadjuvantes e pouco desenvolvidas num filme de três horas de duração em que Luchino Visconti busca mesclar o lirismo típico do neo-realismo com o comovente melodrama passional. Quase todo centrado no excessivamente nobre e piedoso Rocco, a tempestuosa relação entre Nádia e Simone é que envolve o espectador até porque são de Annie Girardot e Renato Salvatori as grandes interpretações do filme. Como não poderia deixar de ser Giuseppe Rotundo (imagens) e Nino Rota (música) contribuem brilhantemente para este clássico. 8/10






Direção: Luchino Visconti / Elenco: Alain Delon - Renato Salvatori - Katina Paxinou - Annie Girardot - Rocco Vidolazzi - Max Cartier - Spiros Focas - Claudia Cardinalle - Suzy Delair - Paolo Stoppa - Roger Hanin - Corrado Pani - Alessandra Panaro - Nno Castelnuovo - Sauveur Chioca - Renato Terra - Felice Musazzi.

terça-feira, 21 de março de 2017

RAINHA CHRISTINA (Queen Christina), 1933


Algumas atrizes lendárias do cinema eram lindas, outras ótimas interpretes; Greta Garbo era tudo isso e ainda dona de personalidade ímpar que se reflete com perfeição em “Rainha Christina”. Enérgica, valente e vulnerável ao mesmo tempo, Garbo faz de Christina um personagem memorável. Educada como homem para assumir o trono sueco, a jovem rainha é um protagonista andrógino na primeira parte do filme, ainda que fique difícil acreditar que passe despercebido pelo embaixador espanhol Antônio (John Gilbert) ele ser ela. O drama biográfico de Rouben Mamoulian, realizado já na vigência do abominável Código Hays, mostra Christina como lésbica (Garbo o era na vida real) com a rainha dizendo a frase famosa: “Não pretendo morrer solteiro”. Ponto alto do filme é a sequência latentemente homoerótica do encontro de Christina com Antônio que ‘corteja o rapaz’, momento que termina com ela despindo apenas um casaco e se revelando uma maravilhosa mulher. A abdicação à coroa é outra bela sequência num filme com excelente produção da MGM e com Greta Garbo fascinantemente fotografada. John Gilbert, ao contrário do que se conta, tinha boa voz mas torna seu personagem semicaricato. Maior sucesso de bilheteria de 1933 e o ápice da carreira da atriz sueca aos 28 anos de idade. 8/10






Direção: Rouben Mamoulian / Elenco: Greta Garbo - John Gilbert - Ian Keith - Elizabeth Young - Lewis Stone - Akim Tamiroff - Reginald Owen - C. Aubrey Smith - Cora Sue Collins - Gustav von Seyffertitz - Georges Ranavent - Nuriel Evans - James Burke - Edward Gargan - Paul Hurst - Fred Kohler - Ferdinand Munier

quinta-feira, 16 de março de 2017

UMA RAJADA DE BALAS (Bonnie & Clyde), 1967


Os roteiristas David Newman e Robert Benton escreveram a história de Bonnie Parker e Clyde Barrow, dupla de bandidos assassinos dos tempos da recessão. Contataram Warren Beatty para produzir e queriam Jean-Luc Godard para dirigir, certamente porque assistiram “Pierrot Le Fou” que também tem uma dupla de transgressores da lei. Godard pulou fora do projeto que acabou nas mãos de Arthur Penn que fez de “Uma Rajada de Balas” um dos filmes mais importantes da década, influenciando a moda, rendendo muitas músicas sobre o tema e fazendo com que Hollywood nunca mais fosse a mesma ao tratar da violência. Em “Uma Rajada de Balas” Penn incorporou um pouco do estilo da Nouvelle Vague e acrescentou pitadas de humor por vezes desnecessárias. O melhor do filme são as sequências de ação (fuga da polícia no motel e a emboscada final), além da Direção de Arte de Dean Tavoularis. Bonnie Parker e Clyde Barrow ficariam felizes se vissem como ficaram bonitos interpretados por Faye Dunaway e Warren Beatty, mas os melhores em cena são os veteranos Denver Pyle e Dub Taylor. Enorme e merecido sucesso de bilheteria, “Bonnie & Clyde” concorreu ao Oscar em dez categorias levando o de Melhor Fotografia e de Atriz Coadjuvante (Estelle Parsons), num ano de disputas sensacionais. 8/10






Diretor: 

segunda-feira, 13 de março de 2017

DO MUNDO NADA SE LEVA (You Can't Take it with You), 1938


Populista, idealista ou demagogo, Frank Capra pode ser adjetivado de muitos modos por seus filmes, especialmente por “Do Mundo Nada se Leva”. Porém dificilmente o mais radical de seus críticos deixará de rir com esta comédia que se passa em sua maior parte numa casa pertencente a uma excêntrica família cujo patriarca tem por lema “Nada material tem valor na vida”. Condena ele todo tipo de ‘ismos’ como comunismo, fascismo, esquecendo-se de anarquismo. O estilo de vida de Martin Vanderhoff (Lionel Barrymore), que há décadas se empenha em fazer amigos, conflita com a ganância de Anthony P. Kirby (Edward Arnold) que, ao contrário dedicou sua existência a aumentar a fortuna herdada. Em meio a hilariantes confusões desfilam tipos tão bizarros quanto engraçados, sendo o mais divertido deles o professor de dança russo (Mischa Auer) que tem como aluna a já deliciosa Ann Miller aos 15 anos de idade. Estréia no cinema de Dub Taylor num filme dominado por Barrymore e Arnold e com James Stewart parecidíssimo com Stan Laurel. “Do Mundo Nada se Leva” recebeu o Oscar de Melhor Filme e Capra o de Melhor Diretor (seu terceiro e último Oscar). Datado em seu conteúdo social, as risadas são garantidas, assim como o sentimentalismo infalível de Capra. 8/10




Diretor:

domingo, 12 de março de 2017

CONTOS DE TÓQUIO (Tokio Monogatari), 1953


Wim Wenders diz que Yasujiro Ozu é seu único mestre, considerando o cinema do diretor japonês “um tesouro sagrado”. Wenders descobriu Ozu em 1973, mas antes disso o falecido crítico Ronaldo Monteiro (“Correio da Manhã”/RJ), já chamava a atenção para o particularíssimo estilo de Ozu, praticamente desconhecido no Ocidente. Sua obra-prima é “Contos de Tóquio”, também conhecida por “Viagem a Tóquio” ou “Era Uma Vez em Tóquio”, hoje reconhecido quase unanimemente como um dos melhores filmes de todos os tempos. Falando da velhice de um casal e do descaso dos filhos, esta é uma película que penetra tristemente na alma de quem o assiste. “Contos de Tóquio” é de uma singular simplicidade marcada essencialmente pela câmara estática sempre rente ao chão e a concisão de movimentos e diálogos. Quase uma crônica observando os comportamentos dos personagens, predominam o silêncio e a melancolia mesmo que Ozu jamais dramatize o sofrimento e a fatalidade. As atrizes Setsuko Hara e Haruko Sugimura são os destaques maiores do elenco perfeito deste notável filme. Possivelmente inspirado em “A Cruz dos Anos” (1937) de Leo McCarey, certamente motivou “Em Família” (1971), o doloroso drama familiar de Paulo Porto com Fernanda Montenegro e Odete Lara. 9/10





Diretor:

quinta-feira, 9 de março de 2017

RASTROS DE ÓDIO (The Searchers), 1956


Quando Ethan Edwards elevou a frágil e assustada sobrinha acima de sua cabeça e abraçando-a lhe disse “Let’s go home, Debbie”, estava o cinema sendo elevado a um momento maior de grandeza e poesia. Porém, ao longo das duas horas deste faroeste, o autor da frase e do delicado gesto foi mostrado como o mais sombrio e amedrontador personagem principal que um western jamais exibira ou exibiria. De forma devastadora John Ford rompeu com os arquétipos de heróis que o gênero criara e apresentou um homem não só rude e corajoso, mas e principalmente neurótico, preconceituoso e por fim paradoxal no seu comportamento. Excepcional cinematografia de Winton C. Hoch, excelente trilha musical de Max Steiner com o tema principal de Stan Jones executado pelo Sons of Pioneers e a Ford Stock Company em sua melhor forma. Senão o melhor filme já feito, um dos melhores de todos os tempos, conforme atestam inúmeras enquetes, entre elas as decenais da revista inglesa “Sight & Sound”. A parceria Ford-Wayne que resultou em tantos brilhantes filmes atingiu com “Rastros de Ódio” seu ponto mais alto, inquestionável verdadeira obra de arte cinematográfica. 10/10 - Resenha completa no blog http://westerncinemania.blogspot.com.br/






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domingo, 5 de março de 2017

CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO (Bad Day at Black Rock), 1955


Classificado por diversos autores como ‘western’, este filme de John Sturges tem suspense, mistério como os policiais noir e, mais que tudo toca na questão da consciência social. Os meros 81 minutos de “Conspiração do Silêncio” condensam isso tudo ao contar uma história que resvala no ódio de norte-americanos pelos nikkeis (descendentes de japoneses nascidos nos EUA) após o ataque a Pearl Harbor. Em 1945 chega à calorenta Black Rock um estranho, sem um dos braços, que quer apenas entregar uma medalha ao pai de um nikkei morto na II WW que lhe salvou a vida. Ele é a vítima da conspiração silenciosa do bando de covardes que hostilizam o estranho que afinal descobre que por trás desse comportamento há um crime de morte. O enredo de Millard Kaufman cita também Manzanar, um dos campos de concentração criados durante a guerra para internar os nikkeis e até então assunto tabu para Hollywood. O envelhecido Spencer Tracy compensa com perfeito desempenho a equivocada escolha para interpretar o ex-soldado de um só braço que destrói Ernest Bognine com golpes de karatê. Incrível o time de coadjuvantes (Brennan, Ryan, Borgnine, Marvin e Jagger) neste que é um dos grandes filmes de John Sturges. 8/10






Diretor:

sexta-feira, 3 de março de 2017

DEPOIS DO VENDAVAL (The Quiet Man), 1952


John Ford passou anos tentando fazer este filme, só conseguindo realizá-lo num estúdio menor, a Republic Pictures, o único que se arriscou ao capricho do diretor. Ford disse que "Depois do Vendaval" era apenas uma história de amor, porém mais que isso é uma história de amor dele próprio à adorada Irlanda de seus ancestrais. Levar à tela essa quase obsessão deu muito dinheiro à Republic e muitos prêmios ao filme, entre eles o quarto e último Oscar como Melhor Diretor a Ford. "Depois do Vendaval" enternece e diverte ao contar como John Wayne consegue domar Maureen O'Hara, tendo um dote como obstáculo maior, maior até que o cunhado Victor McLaglen. Para isso Wayne desobedece aos costumes do pequeno lugarejo irlandês que mais se assemelha a um paraíso idealizado por Ford, ainda que seja lembrado o separatista IRA. Entre os muitos belos momentos do filme brilhantemente musicado por Victor Young e com imagens maravilhosas de Winton C. Hoch está a sequência em que Barry Fitzgerald vê a cama do casal destruída na noite de núpcias e exclama: "Impetuoso! Homérico!" Wayne e Maureen reunidos pela segunda vez estão perfeitos, com Wayne mostrando que era sim bom ator quando exigido, secundados pelo ótimo Ward Bond, desta vez como um padre. 8/10






Diretor: