quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

SEM LEI E SEM ALMA (Gunfight at the OK Corral), 1957


Tanto o produtor Hal B. Wallis como o diretor John Sturges não gostavam da versão de John Ford sobre Wyatt Earp e o evento no Curral OK. Sturges chegou mesmo a dizer que o western de Ford era uma ‘merda’ e Wallis sonhava produzir um faroeste que mostrasse Wyatt Earp e Doc Holliday desmistificados. E claro, de olho no sucesso pois acima de tudo ele era um produtor e cinema existia para se ganhar dinheiro. Foi reunido um grande elenco encabeçado por Burt Lancaster e Kirk Douglas, bela fotografia de Charles Lang em VistaVision, Dimitri Tiomkin bastante inspirado e o vozeirão de Frankie Laine cantando o marcante tema principal. Sturges realizou um excelente western historicamente tão irreal como “Paixão dos Fortes”. Tanto que dez anos depois o diretor voltou ao mesmo tema com “A Hora da Pistola’ para corrigir o roteiro de Leon Uris escrito para “Sem Lei e Sem Alma” que mostra uma latente relação homossexual entre Wyatt e Doc. Lancaster chegou a dizer que esses dois personagens “mais pareciam duas bichas pré-freudianas”. Kirk Douglas tem desempenho excepcional, seguido por Jo Van Fleet e Lancaster só deixa de fazer discursos durante o célebre tiroteio. Enorme sucesso de público este é um western que divide as opiniões que só convergem quanto a ser, apesar de tudo, imperdível. 8/10 - Resenha completa no blog http://westerncinemania.blogspot.com.br/

terça-feira, 27 de dezembro de 2016

20.000 LÉGUAS SUBMARINAS (20,000 Leagues Under the Sea), 1954


Esta foi a primeira produção da Buena Vista, dos estúdios de Walt Disney, levando às telas o clássico de ficção-científica escrito em 1870 por Jules Verne (Júlio Verne, para nós), da série ‘Viagens Extraordinárias’. E que extraordinária viagem cinematográfica essa dirigida por Richard Fleischer, verdadeiramente assombrosa à época de seu lançamento, que no Brasil ocorreu em 1955 acompanhada por um álbum de figurinhas da Editora Vecchi com cromos com as fotos do filme. Milhares de garotos foram então ‘apresentados’ a Kirk Douglas vibrando com ele em sua aventura à bordo do Nautilus lutando contra diversos inimigos, inclusive um polvo gigante. Mas nenhum inimigo tão ameaçador quanto o delirante Capitão Nemo vivido por James Mason. Gregory Peck foi o primeiro nome cogitado para interpretar o marinheiro ‘Ned Land’ e Walt Disney acertou em cheio ao pagar 175 mil dólares a Kirk Douglas que criou um herói inesquecível. A história já havia sido filmada em 1916 e “20.000 Léguas Submarinas” assistido mais de 60 anos depois, nestes tempos em que cinema se confunde com efeitos especiais, continua um divertimento imperdível. 8/10

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

QUEM É O INFIEL? (A Letter to Three Wives), 1949


Realizado pela 20th Century-Fox e mesmo tendo sido premiado com dois Oscars – Melhor Direção e Melhor Roteiro, recebidos por Joseph L. Mankiewicz – este é um dos filmes menos lembrados entre aqueles da primeira fase da carreira de Kirk Douglas. Examinando a vida de três casais de classe média, Mankiewicz cria uma trama inusitada na qual um dos três maridos trai a esposa. Elas são avisadas por uma carta que as deixa em pânico e faz com que, através de flashbacks, relembrem da ameaça a seus lares chamada ‘Addie Ross’, a amiga comum das três esposas e que em comum tem ainda o fato de ser admirada pelos três maridos. O inteligente roteiro sugere que as esposas não poderiam mesmo confiar na amiga fatal, também a narradora invisível da história (voz de Celeste Holm). O espectador é desafiado a descobrir qual dos maridos sucumbirá, num final surpreendente que perde a força em função do feliz ‘The End’ que o filme não merecia. Como um mal remunerado professor de Literatura, Kirk Douglas tem alguns dos melhores momentos do filme. Ann Sothern é a esposa de Douglas e Jeanne Crain e Linda Darnell são as outras duas, num elenco em que se destacam Paul Douglas e Thelma Ritter. 7/10

quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

ÊXITO FUGAZ (Young Man with a Horn), 1950


Mas como? Kirk Douglas era trompetista? Não, não era, assim como não sabia lutar boxe, montar a cavalo, tocar banjo e tantas outras habilidades às quais sua determinação e profissionalismo o levou a executar com perfeição. Para interpretar o lendário Bix Beiderbecke, biografado como ‘Rick Martin’ em “Êxito Fugaz”, Douglas tem mais uma admirável performance ainda que quem toque de verdade em seu lugar seja Harry James. Bix Beiderbecke morreu aos 28 anos em 1931 e essa biografia ficcional foi escrita em 1945, com a Warner logo pensando em John Garfield para protagonizá-la. Sabiamente Jack Warner optou por seu contratado Kirk Douglas, então com 33 anos em 1949, ele que havia impressionado com seu desempenho como boxeur em “O Invencível”, naquele mesmo ano. A direção foi entregue à competência de Michael Curtiz que desta vez ficou abaixo dos grandes filmes que fazia um atrás do outro. Mesmo assim “Êxito Fugaz” é uma festa para os fãs de música com a maravilhosa Doris Day cantando e encantando com alguns standards da canção norte-americana e a presença de Hoagy Carmichael que, na vida real, tocara com Beiderbecke. Lauren Bacall é a mulher que destrói a vida do trompetista e uma pena que o forçado final feliz ignore o trágico fim do músico que em seu tempo só tinha Louis Armstrong com talento semelhante. 7/10

terça-feira, 20 de dezembro de 2016

VIKINGS, OS CONQUISTADORES (The Vikings), 1958


Por Odin! Esta pode não ser a melhor das aventuras do cinema com sequências em alto mar, mas certamente é a mais bonita, isto graças à excepcional fotografia de Jack Cardiff que por si só vale pelo filme produzido e estrelado por Kirk Douglas. Porém “Vikings, os Conquistadores” é diversão Classe A com Douglas exuberante no melhor de sua forma física como o viking Einar. Excelentes sequências de batalha e uma impressionante tomada de um castelo que culmina com Douglas enfrentando Tony Curtis, seu meio irmão, ambos filhos de Ragnar, rei viking interpretado com a doce brutalidade que era a marca registrada de Ernest Borgnine. Curtis e Douglas disputam o amor da frágil e linda princesa galesa Janet Leigh num espetáculo com ritmo e imagens tão perfeitas que até esquecemos das ingênuas coincidências do roteiro. Há ainda o rigor na reprodução das vestes, armas, costumes e especialmente as réplicas dos navios vikings. Filmado em boa parte nos fiordes da Noruega, esta produção da Bryna fez enorme sucesso de público, boa parte dele apaixonado pelo então casal mais querido do cinema, Tony e Janet. Mas o filme é mesmo de Kirk Douglas, seguido de perto por Ernest, um ano mais novo que Kirk e aqui vivendo seu pai. 8/10

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

GLÓRIA FEITA DE SANGUE (Paths of Glory), 1957


Perguntado sobre qual filme mais teve orgulho em fazer, Kirk Douglas respondeu de pronto: “Sem dúvida, ‘Glória Feita de Sangue’ pela força, coragem e atualidade que mantém”. O ator poderia ter dito mais, como por exemplo que esse filme realizado por Stanley Kubrick aos 29 anos de idade beira a perfeição e é verdadeira aula de como se fazer cinema, inclusive com pouco dinheiro. Custou 935 mil dólares, um terço do que foi gasto com “A Ponte do Rio Kwai”, também de 1957 e que arrebatou uma penca de Oscars. Como muitos outros grande filmes, “Glória Feita de Sangue” sequer foi lembrado em nenhuma categoria, nem mesmo diante da soberba interpretação de George Macready como o odioso General Mireau. Magistralmente Kubrick mostra que morrem em batalha os homens simples enquanto os aristocratas com o peito coberto de medalhas se reúnem em luxuosos castelos onde tramam promoções a custa de calculadas morte nos campos de guerra. Talvez o mais cruel dos filmes, com os sórdidos dez minutos iniciais de diálogo nauseabundo entre os dois generais franceses. A farsa do tribunal militar montado para condenar três soldados cuja execução ‘servirá de tônico para a divisão’ e o impressionante travelling da câmara de Kubrick na trincheira são igualmente pontos altos. O diretor chegou a pensar num final feliz, ideia ainda bem rechaçada e o filme se fecha poeticamente com a moça alemã e soldados (que logo certamente morrerão) irmanados numa terna canção de amor. Obra-prima. 10/10

domingo, 27 de novembro de 2016

A MONTANHA DOS SETE ABUTRES (Ace in the Hole), 1951


Antes de se especializar em destilar seu cinismo diante das fraquezas do ser humano através de suas sarcásticas comédias, Billy Wilder era áspero e cruel. Cruel demais para o gosto norte-americano especialmente com este filme sobre o trabalho da imprensa e que se transformou em um raro fracasso para Wilder. Isto mesmo com a presença de Kirk Douglas encabeçando o elenco. Injusto fracasso pois “A Montanha dos Sete Abutres” é um dos melhores filmes da admirável filmografia de Wilder. Relato amargo que, mais que a imprensa sensacionalista, denuncia o próprio cidadão norte-americano que se deixa conduzir em histeria coletiva para assistir a uma tragédia individual. O inescrupuloso repórter Charles Tatum (Douglas) prolonga ao máximo a agonia de um homem soterrado visando com isso recuperar o respeito que perdera como jornalista de órgãos importantes. Insensível e manipulador, Tatum alicia a corrupta lei na figura do sheriff de Albuquerque (Ray Teal) e despe psicologicamente uma das mais sórdidas mulheres (Jan Sterling) já vistas no cinema. Kirk Douglas interpreta intensa e vigorosamente o abjeto repórter neste drama que o tempo se incumbiu de cada vez mais valorizar. 9/10

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

A RODA DA FORTUNA (The Bad Wagon), 1953


Na década de 50 a MGM produziu alguns dos melhores musicais de todos os tempos. E quase todos eram entretenimentos leves, mesmo considerando que “Os Três Mosqueteiros” (1948) baseou-se no alegre clássico de Alexandre Dumas e o premiadíssimo “Sinfonia de Paris” foi o mais pretensioso musical daqueles tempos. Ainda demoraria para que Shakespeare vertido para as ruas de Nova York desse tons mais trágicos a um musical pois “West Side Story” só tomaria de assalto a Broadway em setembro de 1957. Curioso portanto que “A Roda da Fortuna”, musical de Vincente Minelli propusesse que musicais não devessem fugir de tentativas de adaptações de clássicos como “Fausto” e se pautassem pelo ‘That’s Entertainment’, por sinal um dos melhores números deste filme, ao lado do encantador “Dancing in the Dark” (Fred Astaire e Cyd Charisse), do delicioso “Triplets” (Astaire, Nanette Fabray e Jack Buchanan) e de “A Shine on Your Shoes” (Astaire e Leroy Daniels). “A Roda da Fortuna” fala ainda do esquecimento dos antigos astros e da quase mesma estatura da dupla principal. Mas quem se importa com isso se vê-los dançar é algo transcendente. 7/10

terça-feira, 22 de novembro de 2016

PÃO, AMOR E CIÚME (Pane, Amore e Gelosia), 1954


Para atenuar o sofrimento deixado pela II Grande Guerra, a Itália passou a produzir um número incrível de comédias com nuances do neo-realismo e uma das melhores dessas comédias foi “Pão, Amor e Fantasia”, que Luigi Comencini rodou em 1953, alcançando enorme sucesso. O público adorou ver Vittorio De Sica atuando ao lado de Gina Lollobrigida, ele como o ‘Maresciallo Carotenuto e ela como ‘La Bersagliera’. No ano seguinte houve a sequência “Pão, Amor e Ciúme”, tão ou mais engraçada que a primeira pois colocava o ‘Maresciallo’ em situações ainda mais  constrangedoras no pequeno lugarejo do Sul da Itália chamado Sagliena. Lá ocorriam não apenas fantasias ou ciúmes, mas mexericos aos montes feitos pelas maledicentes línguas do povo local que tinha esse condenável mas característico hábito. E bem que o ‘Maresciallo’ merecia ser a maior vítima dos comentários pois nenhuma mulher bonita lhe escapava ao assédio. E em Sagliena havia ‘La Bersagliera’, a melhor expressão do pecado com sua vivacidade, petulância e formosura. Tão deliciosas foram estas duas comédias de Comencini que a série continuou com “Pão, Amor e...” com Sophia Loren substituindo Gina e ainda “Pão, Amor e Andaluzia” (1955), esta com Carmen Sevilla e De Sica sempre como o libidinoso comandante Carotenuto. 8/10

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

PACTO DE SANGUE (Double Indemnity), 1944


Antes de dirigir o melhor filme sobre Hollywood e a melhor comédia do cinema (“Crepúsculo dos Deuses” e “Quanto Mais Quente Melhor”), o austríaco Billy Wilder havia realizado também o melhor de todos os policiais noir que foi “Pacto de Sangue”. Partindo de uma história de James M. Cain, Billy Wilder se reuniu com o escritor Raymond Chandler para escrever um roteiro perfeito eivado de frases em que a mordacidade só é superada pela inteligência das mesmas. Neste modelo de filme noir não só a envolvente trama mas e especialmente o suspense que Wilder cria em diversos momentos desconcerta e seduz o espectador, do mesmo modo que o corretor de seguros interpretado por Fred MacMurray se mostra impotente para escapar do fascínio exercido por Barbara Stanwyck. Pela primeira vez em sua carreira como uma criminosa, Barbara é adúltera e perversamente calculista, usando uma peruca loura e uma pulseira no tornozelo que enlouquece MacMurray. As sinistras persianas avisam o espectador da tragédia que se avizinha capturada pela estupenda fotografia de John F. Seitz e com a brilhante trilha de Miklos Rosza. Edward G. Robinson é o sagaz inspetor da seguradora que não descobre o crime quase perfeito. 10/10

sábado, 19 de novembro de 2016

CONSCIÊNCIAS MORTAS (The Ox-Bow incident), 1943


É duvidoso aceitar que um faroeste possa dispensar trocas de tiros, emocionantes cavalgadas, cenários deslumbrantes, roteiro fácil e tudo o mais que invariavelmente caracteriza o gênero. Mais ainda que um western possa refletir comportamentos humanos abjetos ao abordar um assunto desagradável que o cinema sempre evitou tocar. Esse filme existe, foi filmado em 1941 graças aos esforços e tenacidade de Henry Fonda e do diretor William A. Wellman, sendo lançado em 1943 com o título “Consciências Mortas”. Com apenas 75 minutos de duração, metragem quase de um western B, transformou-se num dos mais admirados faroestes até hoje produzidos. Sombrio, pessimista, trágico mesmo, expõe a covardia de uma turba histérica que se nega a dar a inocentes o direito de defesa. Tomados por fúria coletiva encontram no linchamento a solução para encobrir suas próprias fraquezas. Henry Fonda era então, no elenco, o único nome capaz de atrair o público que não se interessou em ver “Consciências Mortas”. Mais tarde Orson Welles e Clint Eastwood externaram profunda admiração por este filme que a quase unanimidade da crítica reverencia como obra-prima do gênero. 9/10 - Resenha completa no blog http://westerncinemania.blogspot.com.br/

terça-feira, 15 de novembro de 2016

CASABLANCA, 1943


Obra-prima do cinema romântico, este filme de Michael Curtiz não se limita jamais a esta simples definição de gênero. O extraordinário roteiro de “Casablanca” abriga intrigas e mistério como deve ser um bom policial noir e ainda reflete magnificamente a tensão vivida durante a II Grande Guerra. Como nenhum outro faz jus ao termo ‘cult’, ou seja, aquele filme que jamais nos cansamos de rever porque nos delicia a amoralidade de Humphrey Bogart e o encantador vezo corrupto de Claude Rains. O grupo de misteriosos personagens que se cruzam na fascinante atmosfera do ‘Ricks’, onde se passa a maior parte da história, trama suas aventuras ao som da voz rouquenha e inesquecível de Dooley Wilson. Entre outras maravilhosas canções ouve-se a contagiante “Knock on Wood” e “As Time Goes By”, esta já com a presença de Ingrid Bergman, nunca antes ou depois mais bonita. O durão Bogart mostra que sabe ser sensível e sucumbe ao amor impossível lembrando que “sempre haverá Paris” e ao final dando o que falar com a amizade que inicia com o chefe de polícia francês. Magistral direção de atores de Michael Curtiz, responsável maior pela quase perfeição de “Casablanca”. O quase fica por conta do inexpressivo Paul Henreid. 10/10

domingo, 13 de novembro de 2016

A COMPANHEIRA DE TARZAN (Tarzan and His Mate), 1934


Edgar Rice Borroughs negociou com a MGM o direito de adaptar suas histórias sobre o heroi e o estúdio então passou a fazer o quem bem entendeu com ele. Depois do enorme sucesso do primeiro filme da série com Johnny Weissmuler, a imaginação de Cedric Gibbons, diretor de arte do estúdio, extrapolou os limites de sua criatividade e veio “A Companheira de Tarzan”, até hoje o melhor de todos os filmes sobre o Rei das Selvas. Gibbons reduziu a participação de Tarzan e ampliou a de Jane, na medida exata em que explorou ao máximo a sensualidade que a pouca roupa da heroína permitia, ou seja, quase tudo. Realizado pouco antes de entrar em vigência o Código Hays, os espectadores puderam ver a nudez de Jane na famosa sequência aquática que logo seria excluída do filme em nome da moral e dos bons costumes. E quem o público via, de fato era a nadadora olímpica Josephine McKim dublando Maureen O’Sullivan. Por quase 50 anos essas cenas foram dadas como desaparecidas até que, encontradas, o filme foi restaurado na íntegra, como Gibbons sonhou. Excepcional filme de ação com Weissmuller ainda magro, com espaço para o lirismo entre Jane-Tarzan, Cheeta vivendo perigos e... a reduzida tanga da inesquecível Maureen O’Sullivan. 9/10

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

OS BRUTOS TAMBÉM AMAM (Shane), 1953


Poucos discordam que “Shane” seja o mais admirado faroeste de todos os tempos e pode-se perguntar o que levou o filme do meticuloso George Stevens a essa quase unanimidade? Certamente não foi seu previsível roteiro narrando como o desconhecido pistoleiro coloca as coisas no lugar na região dominada pelos brutos Rykers. Não foi também a trama paralela envolvendo o obsequioso e respeitador estranho e o casal Starrett, trama esta que não chega a lugar nenhum mesmo sendo Joe Starrett o mais compreensivo lavrador do Wyoming. Há a admiração pelo elegante matador de aluguel Wilson, menor apenas que aquela devotada a Shane, especialmente quando este traja sua inconfundível roupa de pele de gamo que ainda mais reduz o tamanho do diminuto e mitológico (como gostam de dizer) herói. Não há quem não ressalte, por mais enfadonho que isso seja, a invenção de o espectador ver o filme pelos olhos do onipresente menino, aquele que não perde uma chance de fazer ecoar pelos vales perdidos o nome ‘Shane’. E nem pensar que Victor Young tenha exagerado na sacarose no tema musical igualmente cultuado. Falta apenas pensar naquele que é o mais bizarro cinturão do Velho Oeste... 7/10 - Resenha completa no blog http://westerncinemania.blogspot.com.br/

O SOL POR TESTEMUNHA (Plein Soleil), 1960



René Clément foi um dos diretores massacrados pela turma da Nouvelle Vague. E justamente no ano em que foram lançados “Acossado”, “Os Incompreendidos” e “Hiroshima, Mon Amour”, Clément respondeu a Godard, Truffaut e cia. com um suspense que marcou época: “O Sol por Testemunha”. Esqueça-se o tom sombrio dos filmes noir, as vielas escuras e as feições abrutalhadas dos vilões. Este thriller policial é luminoso, ensolarado, e excepcionalmente inteligente, com um trio central formado por atores muito bonitos. Alain Delon esbanja charme como o amoral e ardiloso vilão que cobiça não só a fortuna do amigo mas também ficar com sua namorada. A autora Patricia Highsmith gostou do filme e disse que ao escrever a história em 1955 jamais imaginara alguém como Delon para interpretar o talentoso Mr. Ripley. Filmado em estonteantes locações no Mar Mediterrâneo, o filme de Clément possui uma sequência antológica quando Tom Ripley percorre uma feira livre de rua em Nápoles e os peixes mortos olham para ele como que o condenando pelos assassinatos cometidos. As nuances homossexuais do livro foram atenuadas, o que não ocorreu no remake “O Talentoso Mr. Ripley”, de 1999. Embora muita tinta tenha sido gasta com o inovador “Acossado”, o público preferiu mesmo ver o excelente “O Sol por Testemunha”. 9/10

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

O PAGADOR DE PROMESSAS, 1962


Anselmo Duarte faleceu aos 89 anos de idade e nas últimas cinco décadas de sua vida foi um homem amargurado e rancoroso. Mesmo após ter realizado um dos marcos da cinematografia brasileira – “O Pagador de Promessas” – Anselmo nunca teve seu talento como diretor devidamente reconhecido aqui no Brasil. Conviveu com o ciúme de toda uma geração de cinemanovistas (e seus seguidores) que nunca o perdoou por fazer um cinema sem modismos.  ‘Acadêmico’ era o adjetivo menos pejorativo que Anselmo recebia, de nada adiantando ter vencido Buñuel, Antonioni, Preminger e outros idolatrados diretores ao trazer para o Brasil a ambicionada Palma de Ouro. Levada ao cinema após ser encenada em 1960, a história de Dias Gomes não perdoa ninguém, desde a intolerância da igreja ao sensacionalismo da imprensa, passando pela polícia corrupta. Abordando tema brasileiríssimo que é o sincretismo religioso, Anselmo filmou quase que inteiramente nas escadarias da Igreja do Santíssimo Sacramento do Passo, em Salvador. Leonardo Villar estupendo como Zé do Burro e brilhantes Norma Bengell e todo o elenco. “O Pagador de Promessas” sempre emociona e é um filme perfeito, descontada a música intrusiva de Gabriel Migliori. 10/10

terça-feira, 8 de novembro de 2016

JANELA INDISCRETA (Rear Window), 1953


Cada cinéfilo tem seu(s) Hitchcock preferido(s) e para mim, se o Mestre do Suspense não levou os nervos da plateia ao limite com “Janela Indiscreta”, nos deu um de seus filmes mais fascinantes. Alfred Hitchcock transforma cada um de nós em voyeur a cada minuto mais obcecado. O fotógrafo preso à cadeira de rodas é o próprio espectador que, como lembrou Hitch, exercita através do cinema seu desejo de espiar comportamentos no mais das vezes reprováveis. Filme claustrofóbico mas que jamais cansa porque o diretor sabe exatamente o que quer e o que faz. E Hitch quer, como de hábito, brincar com o público que paga para ver seus filmes. Chegou-se a dizer que esta é a película mais pessoal do diretor pois a imobilidade do fotógrafo significaria sua impotência. E Grace Kelly está ali mais linda que nunca diante de um James Stewart incapaz de se levantar de sua cadeira de diretor, digo de rodas. Assim como Hitch, Stewart também se apaixonou por Grace durante as filmagens. Baseado na história “It Had to Be Murder”, pulp fiction de Cornell Woolrich enriquecida pelos cáusticos diálogos de John Michael Hayes. Raymond Burr impressionante como o matricida. 10/10

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

OS CORRUPTOS (The Big Heat), 1953


Nenhum outro diretor desafiou o famigerado Código Hays como o fez Fritz Lang em 1953 com o policial noir “Os Corruptos”. Originalmente planejado para ter no elenco Edward G. Robinson, George Raft e Paul Muni, ficou para Glenn Ford a responsabilidade de desempenhar o detetive que confronta todo o corrompido sistema político-policial de uma fictícia grande cidade. E Glenn Ford se vê às voltas com um jovem ator – Lee Marvin – de quem ninguém poderia suspeitar que logo faria James Cagney parecer um coroinha. Nesse sensacional duelo de violência entre Ford e Marvin o policial é movido por vingança pessoal e o gângster (Lee) por sua incontida bestialidade. E Glenn Ford tem seu momento maior no cinema expressando magnificamente não só desespero e angústia mas e principalmente a solidão que apenas os corajosos conhecem de verdade. Num filme onde as mulheres têm igual importância à dos homens, Jeanette Nolan está estupenda como a egoísta viúva e brilha Gloria Grahame que tem o rosto de boneca desfigurado por Lee Marvin numa sequência apavorante. Chamar “Os Corruptos” de clássico é pouco para este extraordinário filme de Fritz Lang.  9/10

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

O PIRATA SANGRENTO (The Crimson Pirate), 1952


Jamais haverá um filme sobre aventureiros do mar como “O Pirata Sangrento” por uma razão muito simples: jamais haverá outro Burt Lancaster. Bem que volta e meia Hollywood procurou, entre seus grandes astros, algum que chegasse perto de Douglas Fairbanks Sr. Desfilaram no gênero capa-e-espada entre outros, Tyrone Power, Yul Brynner, Gregory Peck, Rock Hudson e Errol Flynn depois de ser Robin Hood. Foi, no entanto, em 1952 que Burt Lancaster, sempre em companhia de Nick Cravat, assombrou o mundo com a mais empolgante, movimentada e deslumbrante aventura de um corsário: “O Pirata Sangrento”. Lancaster e Cravat tiram o fôlego do espectador não só com as incríveis acrobacias feitas sobre galeões, balões e onde mais se encontrem, mas com as gargalhadas provocadas nesta que é a mais divertida aventura marítima do cinema. E pensar que Johnny Depp chegou a receber 60 milhões de para se vestir outra vez como Jack Sparrow. Creditada a direção a Robert Siodmak, “O Pirata Sangrento” é puro Burt Lancaster que foi também o produtor. Saboroso roteiro de Roland Kibbee e esplendorosa fotografia de Otto Heller com cenários naturais da Ilha de Ischia, na costa de Nápoles. 10/10

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

SINDICATO DE LADRÕES (On the Waterfront), 1954


O título nacional muito mais apropriado que o original não deixa dúvidas quanto à intenção deste corajoso filme de Elia Kazan, diretor que nunca conseguiu se livrar da pecha de covarde. Denunciando sem meias palavras a máfia que controlava os trabalhadores no porto de Nova York, “Sindicato de Ladrões” tocou em assunto que jamais o cinema havia tido a ousadia de focalizar. A violência das organizações sindicais é mostrada num filme que conseguiu capturar prodigiosamente a atmosfera sinistra da zona portuária. Para isso foram fundamentais o extraordinário trabalho do cinegrafista Boris Kauffman e a música incidental do compositor Leonard Bernstein, este antecipando o que faria em sua segunda e final incursão no cinema com outra obra-prima que foi “Amor, Sublime Amor  (West Side Story). Indicado para o Oscar em 12 categorias, recebeu oito das principais estatuetas arrebatando ainda todos os demais prêmios cinematográficos importantes daquele ano. Muito se falou que com este filme Kazan tenha tentado justificar seus pecados, o que tem menor importância diante da grandeza de “Sindicato de Ladrões”. Marlon Brando notável, assim como Lee J. Cobb, num elenco impecável. 10/10

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

O SEGREDO DAS JÓIAS (The Asphalt Jungle), 1950


John Huston era, em 1950, um conceituado diretor de cinema. Mesmo assim aceitou o desafio de dirigir um filme no qual não havia um único astro para atrair o público. Quem poderia suspeitar que Huston criaria um influente filme policial sem charmosos detetives a la Humphrey Bogart ou vilões como Edward G. Robinson no elenco. Mais que isso, atores pouco conhecidos interpretando, quase todos, tipos simplórios tendo em comum a tendência para o fracasso, uma constante nos filmes de John Huston. O assalto a uma joalheria não é o clímax do filme pois ocorre na metade da película. Mesmo sendo admiravelmente filmada essa sequência tem menor importância pois o objetivo maior do roteiro de Ben Meadow em parceria com Huston é estudar cada um dos angustiados personagens antes e após o roubo. O título original faz menção à decepção que Dix Handley (Sterling Hayden) tem com a cidade grande que ele pretende abandonar voltando para suas origens rurais no Kentucky. Magnífica fotografia e raro exemplo de interpretações perfeitas de todo o elenco, com destaque maior para Sam Jaffe e Louis Calhern. Imperdível ver Marilyn Monroe antes da fama e Jean Hagen (a ‘Lina Lamont’ de “Cantando na Chuva”) num papel sério. 9/10

terça-feira, 25 de outubro de 2016

OS ETERNOS DESCONHECIDOS (I Soliti Ignoti), 1958


A ‘Comédia à Italiana’ foi um gênero que marcou época e que teve início com “Os Eternos Desconhecidos”, filme de Mario Monicelli. Com nuances do movimento neo-realista, essa comédia tem profundo caráter social com personagens identificados com pessoas simples. Passa-se numa Roma inteiramente diferente da focalizada, por exemplo, em “La Dolce Vita” e reúne um grupo de atrapalhados vigaristas sempre prontos a dar golpes. A parte final até que se aproxima de “Rififi”, de Jules Dassin, do qual “Os Eternos Desconhecidos” seria uma paródia, mas o pitoresco de cada tipo e os saborosamente sarcásticos diálogos fazem do filme de Monicelli uma comédia incomum. Um genial achado do roteiro é o personagem de Totó que reverencia toda a comicidade que o cinema italiano criou anteriormente. Traz o grande ator dramático Vittorio Gassman fazendo rir a cada fala sua e ainda Memmo Carotenutto e Marcello Mastroianni, este menos engraçado. Presença da bela Rossana Rory e das então jovens promessas Claudia Cardinalle e Carla Gravina. “Os Eternos Desconhecidos” concorreu ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, deu a Gassman o Nastri d’Argento de Melhor Ator e teve uma sequência intitulada “O Golpe dos Eternos Desconhecidos”, dirigida por Nanni Loy, com quase todo o mesmo elenco em 1959. Em 1985 foi filmado “Uma Dupla Irreverente” (I Soliti Ignoti Vent’Anni Dopo), com Mastroianni e Tiberio Murgia. O filme de Monicelli é uma comédia clássica que a cada revisão se mostra mais engraçada. 9/10

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

SPARTACUS, 1960


Hollywood passou toda a década de 50 inventando fórmulas para combater a televisão que lhe roubava público. Os superespetáculos tornaram-se rotina com suas telas e elencos imensos e histórias quase sempre enfadonhas. Em 1960 “Spartacus” mostrou que superproduções também podiam resultar em excelentes filmes. Para isso Kirk Douglas provou ser o homem mais corajoso do cinema norte-americano, contratando o ‘proibido’ Dalton Trumbo e entregando a direção a um jovem diretor de 31 anos, Stanley Kubrick. Ao invés de se reportar às clássicas histórias bíblicas, “Spartacus” levou para as telas uma questão crucial no país, a dos direitos humanos que a partir de então ganharia cada vez mais corpo no cinema. Diálogos afiadíssimos de Trumbo, história comovente, cinematografia portentosa de Russell Metty com sequências de batalhas inimagináveis e nunca igualadas e um elenco com o brilho de Laurence Olivier, Charles Laughton e Peter Ustinov. A pobre Academia teve a árdua tarefa de decidir a qual dos três dar o prêmio de Melhor ator Coadjuvante (Ustinov). Mesmo ofuscado pela overdose de talento do trio britânico, Kirk Douglas foi um Spartacus vigoroso, convincente e emocionante como escravo-gladiador-líder. Desse esplêndido filme perdoa-se até o forçado final. 10/10

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

O TERCEIRO HOMEM (The Third Man), 1949


Em 1999 o British Film Institute (BFI) promoveu uma enquete com mil pessoas ligadas ao universo cinematográfico para eleger o melhor filme inglês de todos os tempos. O grande vencedor, à frente de “Lawrence da Arábia”, “Desencanto” e “A Ponte do Rio Kwai”, foi “O Terceiro Homem”, suspense noir dirigido por Carol Reed em 1949 com história e roteiro de Graham Greene. A produção do próprio Reed em parceria com Alexander Korda e David O. Selznick recebeu a Palma de Ouro do Festival de Cannes, o BAFTA de melhor filme inglês e um Oscar de Melhor Fotografia em Preto e Branco. Foi o filme escolhido por Martin Scorsese para sua tese de formatura na Escola de Cinema da Universidade de Nova York. História de mistério passada no pós-II Guerra Mundial como tantas outras, “O Terceiro Homem” tornou-se um inesperado e instantâneo clássico devido ao estranho fascínio que o filme exerce, mesmo visto quase 70 anos depois de lançado. A extraordinária cinematografia expressionista mostrando uma Viena sombria e em parte destruída pela guerra, o roteiro inescrutável (que Hitchcock sempre perseguiu), a invulgar música de Anton Karas e um notável elenco internacional completam a direção segura e inventiva de Carol Reed. Mas é Orson Welles nos meros dez minutos em que atua como o cínico e inescrupuloso Harry Lime, inesquecível na desesperada fuga pelas galerias de esgoto às margens do Danúbio, a força maior desta reverenciada obra-prima. 10/10

sábado, 15 de outubro de 2016

CONFIDÊNCIAS À MEIA-NOITE (Pillow Talk), 1959


Solenemente ignorada pela sisuda crítica que não consegue rir, “Confidências à Meia-Noite” é uma das mais perfeitas comédias românticas sofisticadas produzidas pelo cinema norte-americano. Reuniu pela primeira vez Doris Day e Rock Hudson que, a partir de então, se tornariam campeões de bilheteria (ela por quatro anos em primeiro lugar, façanha somente atingida por Shirley Temple). Tony Randall também no elenco estaria junto a Doris e Tony nos filmes seguintes da dupla. Dirigido por Michael Gordon em dia de Billy Wilder, com premiado roteiro de Russel Rouse e Stanley Shapiro, “Pillow Talk” é um filme repleto de situações tão picantes quanto hilariantes numa ‘guerra de sexos’ irresistível. O ricaço Tony Randall quer namorar a decoradora Doris e esta tem uma linha telefônica dividida com o notório compositor e conquistador Rock Hudson. Este quer fazer de Doris mais uma de suas conquistas mas se dá mal porque acaba se apaixonando por ela. E quem não se apaixonaria? Tudo funciona neste filme que mostra Doris Day entrando na fase que levou o público a admirá-la ainda mais e o excelente Rock Hudson fazer piada com a própria sexualidade. Telma Ritter rouba o filme e até Nick Adams faz rir. A canção ‘Pillow Talk’ fez enorme sucesso, assim como o filme. 10/10